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editorial

Compromisso do Hierofante

 

 

"O Hierofante (surgindo na avant-scène, senta-se sobre a caixa do ponto). - Senhoras, senhores, eu sou um pedaço de personagem, perdido no teatro. Sou a moral. Antigamente a moralidade aparecia no fim das fábulas. Hoje ela precisa se destacar no princípio, a fim de que a polícia garanta o espetáculo. Esse estiole o ríctus imperdoável das galerias. Permanecerei fiel aos meus propósitos até o fim da peça. E solidário com a vossa compreensão de classe. Coisas importantes nesta farsa ficam a cargo do cenário de que fazeis parte. Estamos nas ruínas misturadas de um mundo. Os personagens não são unidos quando isolados. Em ação são coletivos. Como nos terremotos de vosso próprio domicílio ou em vastas penitenciárias, assistireis o indivíduo em fatias ou vê-lo-eis social ou telúrico. Vossa imaginação terá de quebrar tumultos para satisfazer as exigências da bilheteria. Nosso bando precatório é esfomeado e humano como uma trupe de Shakespeare. Precisa de vossa corte. Não vos retireis das cadeiras horrorizados com a vossa autópsia. Consolai-vos em ter dentro de vós um pequeno poeta e uma grande alma! Sede alinhados e cínicos quando atingirdes o fim do vosso próprio banquete desagradável. Como os loucos, nos comoveremos por vossas controvérsias. Vamos, começai!" 

 

(Oswald de Andrade, in A Morte, 1976, p. 07)

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